EU NUNCA SAÍ BEM NUMA FOTO 3X4.

Que mistério é esse que cerca o menor dos formatos da foto que não nos deixa apreciar a própria imagem com prazer?

Como posso forçar um falso sorriso se sei que a foto será usada numa ingrata segunda via de RG, roubado junto com a carteira de couro de pelica?

Um tiro no escuro com conseqüências eternas. Um trauma irreversível originado numa cabine com cheiro estranho.

- Não se mexa, não pisque, não olhe para o lado, não respire. Engole o choro.
- Mas meu olho tá ardendo.
- Quer que eu pingue vinagre?

Instantes intermináveis pontuados por 3 clarões insuportáveis, capazes de curar a catarata. Lembro dos momentos de angústia e apreensão à espera da revelação. Uma tripa com 3 fotos seqüenciais caída num compartimento ventilado.

- Não põe a mão, moleque. Quer queimar a fotografia?

Três poses. Três caras completamente diferentes. As fotos eram recortadas e colocadas dentro de um pequeno envelope azul. Uma ia pra ficha da escola, outra para alguma carteirinha de algum lugar que você jamais freqüentaria e a terceira, e mais perigosa, para a carteira da sua mãe.

- Esse é o meu caçula.
- Não diga? Como tá grande.
- E olha que você ainda não viu ele de sunga.

Uma vez, confesso que tentei sorrir no momento do disparo. Pensei em como seria legal mostrar minha carteirinha de estudante na bilheteria, ostentando um riso fácil, largo e sedutor, como o da Gina dos palitos. Ao contrário, saí com o rostão estourado, as narinas abertas, e o sorriso totalmente estranho, com o lábio superior franzido, como se estivesse contra o sol.

A tecnologia evoluiu para o digital nos dando novas chances de melhorar a pose. Em vão. Continuo saindo com cara de “mais procurados da Interpol”.

A foto 3x4 é traiçoeira. Nem cartomante inspirada sabe como será após a revelação.

Fios de cabelo que armam um motim, fazendo uma ola no momento do flash. O olho esquerdo, por natureza, menor do que o direito, que resolve fechar por um milésimo de segundo, te deixando com cara de galã falido do cinema italiano. O vírus, herança deixada pelo cidadão fotografado imediatamente antes de você, que te faz ameaçar o espirro na hora H – a cara de ameaçar é mais feia do que a de espirrar.

- Quem vê cara não vê coração.
- Já te mandaram calar essa boca hoje?

Pra completar, são elas as culpadas por entregar nosso passado sombrio. Olhe agora mesmo para a sua carteira de identidade, tirada em março de 89, e veja se você se parece com o que vê. Longas madeixas, rosto bolacha, óculos com armação de tartaruga e tiara forçando um volumoso topete castanho são apenas algumas das evidências de que o tempo, diferente das fotos 3x4, só nos fez bem.

E não venha me dizer que você sai bem ou que conhece alguém que tenha um book só com fotos 3x4. As únicas pessoas que saem bem são aquelas que ficam de exemplo no mostruário do fotógrafo e, se é que você ainda não sabe, essas pessoas não existem, assim como a Gina dos palitos.