Wednesday, July 26, 2006

SUA IRMÃ VIROU MOCINHA.

Assistindo a novela das oito reparei que estavam abordando o sagrado tema: garotas virando “mocinhas”.

Não vou inventar desculpas nem dizer que só estava de passagem pela sala. Estava sentado no sofá, exclusivamente assistindo à novela. Eu adoro. Decoro nome de personagem, elogio as atuações, fico ansioso para ver a abertura, leio até nome de câmera no lettering final.

Fato é. Quando vi a cena, viajei para o passado, lembrando-me do grandioso dia em que o mesmo aconteceu em casa. Acreditem, não foi comigo.

Eram férias de janeiro em 1989, ainda existia o muro de Berlim, a União Soviética, sorvetes em latas de alumínio e a zebrinha da loteria. Não estou tão certo disso, mas estou com preguiça de pesquisar.

Estávamos eu, meu irmão e amigos do prédio disputando uma acirrada partida no vizinho, quando um chamado nos içou do confronto.

O porteiro, com sorriso sarcástico e camisa azul claro para dentro da calça marinho, disparou. “Shht. Ei? São vocês os meninos do quarenta e um? Então é pra subir”.

Fui sacado de uma grande decisão antes do intervalo. Marchamos para casa. Cruzamos o portão e subimos até o quarto andar. A porta já aberta denunciava algo de grande: um assalto, a visita do Kofi Annan, ou a chegada de uma nova máquina lava-louça.

Minha avó chorava na sala de visitas. O telefone tocava como numa central de telemarketing. A empregada não dava conta dos recados que, àquela hora, já passavam dos cem.

- Filho, senta aqui. A mamãe tem uma coisa pra dizer.
- Manda. (Eu no auge dos nove anos já conseguia arquear de forma assimétrica minhas sobrancelhas para mostrar espanto ou temor).
- Sua irmã virou mocinha.Se estivéssemos no horário nobre, ouviria nesse exato momento, uma música meio assim: flam flam flaaaamm... flam flam flam.
- Quê?
- A Nani virou mocinha. (e ela também desatou a chorar)

Para mim, aquilo soava mais estranho do que aquela história do pintinho da feira de Cães e Gatos encontrada morto, dentro do chinelo de couro do meu pai.

Não tive escolha. Apenas sorri e fui para o quarto.

Como minha irmã, do sexo feminino, podia ter se tornando uma mocinha? A cabeça de uma criança de 9 anos é um terreno fértil a espera de invasões sem terra, mas inchadas e rastelos não fariam a reforma agrária necessária para responder tantas perguntas.

A lista de parabenizações não parava. Meu pai ligou do escritório. Meu primo, então com 15 anos, ligou do México, assim como uma infinidade de gente beirando o terceiro grau de parentesco.

Quer dizer que agora eu sou irmão de uma mocinha? Preciso tirar outro RG? Ah tá, entendi.

Não me lembro de ter dado os merecidos parabéns a ela, por isso, faço agora em público, mostrando todo o meu orgulho pelo ocorrido. Boa mocinha. Juízo agora, hein?

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