Thursday, August 03, 2006

TROMBADINHAS. O PERIGO VESTE CAPUZ.

Acordei assustado. Sonhei que tinha sido roubado por um trombadinha.

Lembra deles? Os trombadinhas povoaram de medo nossas infâncias. Traumas riscados a canivete em nossas almas. Eu tinha mais medo de sair na rua em dia de feira do que engolir bala Soft, no começo de uma sessão de “Dança com Lobos” no cinema.

Trombadinha, pra quem não lembra, é uma versão anos 80 de delinqüente, um mini-craque mal intencionado. Praticamente uma Taça São Paulo de Juniores voltada ao crime.

Eles tinham um jeito único de agir. Conseguiam ser ameaçadores com apenas um olhar. Armavam-se de todo e qualquer objeto urbano como restos de gira-gira, latas de Nescau, retratos-pôster do José Rico, e por aí vai. Não havia como não se sentir intimidado.

Um amigo meu, hoje presidente de multinacional têxtil, chegou a ser roubado com um cachorro quente. O cachorro quente não foi o objeto furtado, mas sim a ferramenta de submissão utilizada para o delito. Delito é uma dessas palavras técnicas muito legais de usar, tipo pró-labore e menisco.

Numa outra ocasião, fui abordado a dois quarteirões de casa. Ele aproximava as mãos do meu rosto e dizia “Óh se eu quisesse”. Depois recuava as mãos, e repetia tudo de novo. Uma mão estava fechada e a outra aberta, com a palma para cima, como que se lamentando, na verdade, ele só queria dizer: “não queria fazer isso, seria uma honra ser o seu par naquele torneio de pôquer com baralho da Playboy, no cruzeiro em Punta, mas terei que ser agressivo para ter acesso a alguns de seus pertences”. Passamos quatro dias e cinco noites nesse agride/não agride. Cansado, suado e atrasado pra tomar o remédio das seis, simplesmente virei de costas e segui para casa. Ainda o vejo no mesmo lugar, sempre repetindo aquele movimento. Segundo o professor de educação física Vidal, tal exercício trabalha os deltóides.

Em uma outra ocasião, meu primo e eu fomos abordados por um trombadinha braço-curto. Uma vergonha para a casta. Ele ali, dono da situação, sentado na frente de uma casa com placa de aluga-se, nem se deu ao trabalho. “Ei, vocês vão dar a grana ou eu vou ter que levantar?”.

Por lei aprovada em março de 75, todo trombadinha deve pesar entre 48,8kg e 53,3kg. Nem mais nem menos. O bigode ou buço deve ser ralo, apenas uma penugem. Os que não tem, rapidamente aprendem o truque da pasta de cola branca e grafite 0,5 em pó. O bom costume recomenda sempre um “Ae mano. Num olha pra trás. Vai andando. Passa a carteira. Tem cinco cruzêro? Se achar é meu? Como não tem? Tá me tirando mano? Vai, vai, sai andando.”

O happy hour deles acontecia invariavelmente nos fliperamas. Lá, ficavam se vangloriando dos feitos do dia. Rapidamente, uma rica exposição de tênis cano alto, bonés de times de basquete, agasalhos, relógios, componentes de bicicleta e ações da Vale era montada. Como passatempo, ainda roubavam outros tontos, isso quando não decidiam nos tirar do controle, assumindo a vez no jogo: “Deixe que mato pra tu”.

As pernas tremem, o olho lacrimeja, a voz afina. Dá vontade de ligar pra casa, pro ministério da defesa, pro CVV, pro Criança Esperança.

Passado o susto, vinha o momento mais legal, o de contar o drama vivido com riqueza de detalhes. “Meu, eram dez homens bem treinados, camuflados e armados com alabardas medievais. Um deles empinava um triciclo enquanto rodava um tchaco logo acima da cabeça. Mais atrás, um anão com roupinha social segurava o doberman na coleira e dava as ordens”. Anão vestindo social dá muito medo.

Que bom que o tempo passou. Espero não sonhar novamente com isso e exorcizar de uma vez por todas esse trauma, isso se não decidirem rodar “O Trombadinha Trapalhão” com Conrado, Duda Little e grande elenco.

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