Wednesday, May 28, 2008

POR QUE TUDO ACABA NA MINHA VEZ?

O café da manhã foi o mensageiro. Mais uma vez o tablete de manteiga acabou na minha vez, antes de besuntar uma das metades do pão. O som arrepiante da faca de inox em contato com a manteigueira veio para confirmar a triste realidade. Foi a gota d’água.

Shampoo, pomada, maionese. Tudo acaba na minha vez de usar.

O que falar das pastas de dente? Estas merecem um parágrafo à parte. Nada é mais frustrante do que não conseguir extrair o creme de dentro do tubo. Você aperta contra a pia até as pontas dos dedos ficarem incandescentes. Um mísero filete colorido dá o flúor de sua graça. É hora de ser rápido e aproximar a escova. No momento do contato o resquício vacilante decide recuar, frustrando mais uma vez as tristes cerdas, que decidem entrar na web para fazerem um cadastro gratuito no Par Perfeito. Se o creme dental falasse, na certa diria um irritante “olé”!

- Então você acha que tudo termina em você?
- Sim doutor. Sempre na minha vez.
- Me diga uma coisa. Este copo de água está meio cheio ou meio vazio.
- Ah, vá pro inferno.

Água boricada, calda de sorvete, crédito do pré-pago. Por que na minha vez?

Isso pra não falar da caixinha de bombons sortidos. Se esta for passada pela sala no sentido anti-horário, pode ter certeza: ou você fica sem bombom, ou fica com o de figo, que é pior ainda.

Ingresso de arquibancada, figurinhas da Copa, pintinho da feira de Cães e Gatos. Lamento, esgotado!

Molhos condimentados também possuem culpa no cartório. Aquele som do ventinho aquoso que a bisnaga vazia emite quando pressionada com força está entre os mais irritantes do planeta, empatado com a voz do Juca Chaves.

Além de não despejar a quantidade desejada de molho, o vapor colorido serve apenas para sujar o prato e muitas vezes a roupa. Em recente e polêmico julgamento no Arkansas, uma bisnaga de mostarda escura foi condenada a dois meses de reclusão em regime semi-aberto no frigobar Prosdócimo de um motel local.

O restinho do protetor solar, o último suspiro da lata de azeite, até palito de dente. Sempre acaba na minha vez.

Mas nada supera a frustração de um rolo de papel higiênico chegando ao fim no momento de mais aperto. Os míseros dois quadradinhos de papel extra-suave que sobram em suas mãos são uma espécie de troco por todas as vezes em que você os desperdiçou em guerras úmidas nos vestiários da vida. Sim, os rolos de papel higiênico guardam rancor e costumam ser vingativos. Perco as contas das vezes em que ouvi aquela parte bege, do começo do rolo, rindo fartamente, como um tio solteirão ao descobrir que o sobrinho mais leitoso teria que operar a fimose (ou seria da fimose?).

- Quando você começou a notar esta “perseguição” contra você?
- Eu não usei o termo perseguição, muito menos aspas.
- Claro que não. Claro que não.
- Não gosto do seu tom, doutor, muito menos deste seu tique de piscar duplamente ao final de todas as frases.
- Procure se acalmar. Desenhe aqui neste bloquinho o que você está sentindo neste exato momento.
- Doutor, isto é alguma brincadeira de mau gosto ou faz parte do tratamento?
- Nem um, nem outro, por quê?
- Porque acabaram as folhas!

(barulho de telefone de consultório)
- Dona Zilda? Suspenda as outras consultas do dia. Nós ainda vamos longe.